O projeto Mulheres em Série abre caminho por um terreno delicado e, por isso mesmo, inexplorado por outras obras de ficção. A escolha de um casal transexual no estágio inicial de mudança, em que os atores ainda apresentam muitas características do seu sexo de nascimento, é uma ousadia a que a série se propõe abertamente. A parceria com a atriz Ana Victoria – Letícia, na série – que se dispôs a revelar todas as fases de sua transição diante das câmeras se converte num diferencial provocativo e instigante para um público ainda muito acostumado a estereótipos e normatizações. “A sociedade age como se pessoas trans brotassem do chão ‘prontas’. Transição é um processo lento, e até difícil, e a gente concilia com o dia a dia. Ninguém entra numa caverna e sai de lá com outro corpo; ele vai mudando lentamente, enquanto você pega o trem lotado, paga as contas, estuda...”, reflete Ana Victoria.
Assim, Mulheres em Série se destaca como a primeira obra audiovisual brasileira a abordar a discussão de gêneros com a utilização de um elenco inclusivo, que coloca seus atores nos papeis que desempenham no universo real. O próprio título da série surge como uma provocação. Segundo a diretora Maitê Sanchez, a escolha do nome é uma clara ironia à produção de peças como acontece nas fábricas. “É uma crítica à padronização da figura feminina que vemos no cinema comercial, na TV e na publicidade, e que cria modelos ideais de comportamento e estética, prisões psicológicas que só permitem a perpetuação do preconceito e da exclusão”, conclui ela, que também fez direção de arte do curta Irene, vencedor do prêmio de Melhor Filme no II Festival de Cinema Universitário da Bahia.